quinta-feira, novembro 10, 2005

O ESTOPIM FRANCÊS

Sergio Denicoli, de Portugal

Alerta máximo: explodiu o problema da imigração que há anos alimentava o ódio e o preconceito velado na Europa ocidental. A velha intolerância étnica e cultural foi infiltrada nas cores das bandeiras de cada país que num passado recente necessitou de mão-de-obra estrangeira. O que acontece na França é uma luta de franceses contra franceses. São cidadãos filhos de imigrantes contra o governo feito para os “nativos”.

E não é uma questão religiosa que envolve os “terroristas islâmicos”, como diria a maniqueísta imprensa ocidental fortemente influenciada pelos ideais norte-americanos. É um problema social, que engloba muçulmanos, ortodoxos, católicos... são pessoas de origem africana, latino-americana e europeus do leste.

Inicialmente os países abriram as portas, deram incentivos sociais, casas para morar e os imigrantes aceitaram fazer o trabalho que os “nativos” não queriam. Lavavam banheiros, serviam mesas, limpavam casas de famílias e avisavam aos conterrâneos: “venham, aqui a vida é melhor!”. E a propaganda atraiu milhares de pessoas que mudaram de pátria para viver ilegalmente, trabalhando em um mercado prostituído que explorava os funcionários sem pagar benefícios. E foram se fixando, e foram procriando, e surgiram novas gerações. Cidadãos de países com os quais não se identificam e onde sofrem discriminação.

Paris em chamas
No dia 27 de Outubro, dois adolescentes de origem africana – de 15 e 17 anos - morreram eletrocutados após se esconderem dentro de um transformador de energia depois de serem, supostamente, perseguidos pela polícia na periferia de Paris. Foi o estopim.

A partir daí, iniciou-se uma onda de violência em toda a França que já dura quase duas semanas e tem como resultado milhares de carros incendiados, explosões em estabelecimentos comerciais, centenas de presos, uma pessoa morta, e uma crise no governo francês. Para muitos, o ministro do interior da França deixou transparecer todo o preconceito que insuflou a revolta, ao chamar os manifestantes de “escória”. O ministro também admitiu que o problema que originou os distúrbios foram negligenciados nos últimos 30 anos. Já o primeiro-ministro, Dominique de Villepin, garantiu que a ordem será restabelecida.

No entanto, para que a “ordem” seja implantada definitivamente é preciso mudar a visão etnocêntrica que está presente no seio do pensamento ocidental europeu. Será preciso ainda enfrentar o problema dessas minorias subjugadas que afetam a entrada delas no mercado de trabalho. O desemprego nos subúrbios franceses é o dobro do registrado em outras regiões. Atinge 20%, chegando até 40% entre os jovens.

E se o incêndio hoje atinge a França, o fogo pode espalhar-se rapidamente para outros países, onde o que não falta é combustível para atear a revolta de quem é subjugado e discriminado.

segunda-feira, novembro 07, 2005

A IMPERFEIÇÃO PERFEITA E O MEFISTOTÉLICO E METAFÓRICO MUNDO DA ECONOMIA

Emerson Cabral

São Francisco de Assis foi quem me deu a luz para escrever este artigo. E isso não tem nada a ver com uma mudança de comportamento religioso, embora meus amigos católicos fervorosos possam, mesmo que por um breve instante, ficar contentes. É que sobre a mesa do escritório, por trás do computador, há uma estatueta do cujo. Dessas de barro, típicas do artesanato nordestino. Olhando para o santo pensei no Big Boss e passei a refletir sobre o universo. E a concluir o óbvio. A imperfeição é perfeita. E perfeito mesmo, só os economistas.

O universo e todas as coisas só estão aí porque não há o que vou batizar de nano-harmonia, expressão natimorta que nos remete às mais recentes descobertas científicas e também a uma abreviação livre de na-na-ni-na-não. No micro, tudo está em desequilíbrio, em situação de caos e desarmonia. Tomemos como exemplo o micro universo do homem, esse ser que não ouso descrever. Se todos saíssemos dos ventres maternos qual biscoito água e sal, ou seja, tudo igual, que seria do pobre Pitanguy e sua legião de seguidores com bombas de lipo-sucção em punho? Pobre do dentista na hipótese da inexistência das cáries! E o que dizer então da fonoaudióloga do Palothi, quer dizer, Palocci? O mundo seria tão chato.

Por falar em Palocci, eis aí uma categoria acima dessa profusão catastróficas de idéias. Pois alguém já viu algum economista que tenha cometido um erro? São a mais perfeita criatura divina a habitar a face da Terra, talvez os únicos seres nano-harmônicos existentes. Quando um deles, por um descuido toma uma decisão ainda carregada de dúvidas - pois até Cristo teve dúvidas - outro, além- mar e trás-montes, tomará a decisão inversa, criando a junção do Yin e do Yang. É como uma espécie de pacto. Economistas agem de maneiras distintas em todas as partes do mundo para que, no frigir dos ovos, tomadas de decisões antagônicas se encaixem. Todas as medidas e pactos econômicos existem em oposição complementar. E assim, dois e dois sempre somarão quatro.

Até mesmo os mais incrédulos hão de concordar. Mesmo aqueles que, dedo em riste, relembram os pseudo-desastrosos planos econômicos de qualquer país de dimensões continentais da América do Sul, por exemplo! Pois se não fossem perfeitos os economistas, a soma no final da conta estaria errada e ela nunca está errada; o destino do dinheiro é que muda de endereço. Daí o pseudo.

Vejamos. Quando um país, cuja população só pensa em cerveja, carnaval e bunda mantém sua taxa básica de juros a níveis mefistofélicos meses a fio, por exemplo!, o que aconteceria com o Produto Nacional Bruto dessa nação? Assim mesmo, com letra maiúscula, porque PNB tem personalidade, nome e sobrenome.

Heim?! Os empresários do setor produtivo talvez aumentassem para três as sessões semanais ao divã e dois os comprimidos noturnos de Lexotan, mas os economistas (os governistas, claro!) diriam que esse país manterá contínuo e forte o jato do extintor na boca do dragão (a outra palavra terminada em “ão” é impronunciável nesses países). Não é perfeito!? Mesmo que a resposta à pergunta anterior seja uma palavra formada pelas letras q, u, e, d, a; na ordem que você achar melhor. Embora hipoteticamente o vice-presidente desse onírico país de vez em quando esperneie.

E se algum São Tomé, ainda insatisfeito com essa argumentação, sugerir que essa q, u, e, d, a pode levar o país a um processo de estagnação econômica seguida de desemprego? Os santos economistas iluminados pelo Grande Arquiteto haverão de encontrar uma explicação celeste, como a que se ouve em alguns países latino-americanos colonizados por portugueses, por exemplo! “É preciso atrair o capital externo para manter a níveis baixos o risco-país!”.E sabe porquê? Por que em um país qualquer famoso por queijos, chocolates e relógios haverá economistas de governo que façam exatamente o contrário. O dinheiro só muda de endereço. E os economistas continuam perfeitos.