sábado, fevereiro 11, 2006

DE FORA PARA DENTRO: REUNIÃO DE PAUTA DO JORNAL NACIONAL

Sérgio Denicoli (*)

(Texto publicado no Observatório da Imprensa)

Sexta-feira, dia 9 de dezembro, 14h30. Está começando mais uma reunião de pauta do Jornal Nacional. Ao redor da mesa, numa sala envidraçada no meio da redação, os editores do telejornal discutem com atenção os acontecimentos do dia, tendo à cabeceira o editor-chefe William Bonner.

Eu havia chegado de Portugal e visitava a Globo como pesquisador da Universidade do Minho. Estava ali para fazer entrevistas com os profissionais da emissora, com o intuito de dar andamento a uma pesquisa acadêmica.

Antes de a reunião começar, Bonner havia sido consultado sobre minha participação, e não se opôs. Seria eu o primeiro jornalista não pertencente à equipe a acompanhar as discussões sobre a pauta do JN após a revista CartaCapital ter publicado a polêmica matéria criticando Bonner (veja aqui) e afirmando, em tom pejorativo, que ele comparava os telespectadores ao Homer Simpson – o preguiçoso e limitado personagem do desenho animado Os Simpsons. A matéria da revista surgiu após um grupo de professores de comunicação ter acompanhado justamente a importante reunião.

Bem-humorado, o editor-chefe rege a orquestra de jornalistas com maestria. Democrático, permite a todos opinarem para em seguida tomar as decisões inerentes ao seu cargo, em consenso com sua equipe.

Um dos factuais do dia era a divulgação de uma pesquisa do Ministério da Saúde sobre a vida sexual do jovem brasileiro. Bonner lembra que as crianças também assistem ao JN e não quer causar constrangimentos com um assunto delicado. Decide-se então fazer apenas uma nota sobre o tema, sem a utilização de imagens.

O editor-chefe esclarece ao "estranho" presente na sala que não é conservador, e deixa clara a sua a preocupação com o que chega aos telespectadores. Ele está visivelmente chateado com as críticas que saíram na imprensa e não quer que suas palavras sejam mais uma vez mal interpretadas.

Diz que criou uma pasta em seu computador com o nome Homer. É onde guarda tudo que recebeu via e-mail sobre o assunto. Lembra da solidariedade por parte dos diretores da Globo e demonstra estar confortado com a confiança de quem sabe que o que é feito ali tem como foco principal o público.

Requisitos essenciais

Perto do término da reunião chega a informação que o presidente Lula havia classificado a oposição brasileira de golpista, numa comparação aos opositores de Hugo Chávez, na Venezuela. A notícia havia sido levantada a partir de uma entrevista de Lula à revista CartaCapital. Bonner considera aquela declaração seriíssima e pede um VT sobre o assunto. Lembra aos editores que citem a CartaCapital e dá uma aula de como se faz jornalismo sem misturar questões pessoais com profissionais. É um tapa de luva em seus críticos.

Encerrada a reunião, ainda na sala, um dos jornalistas sugere um "bolão" para apostas em torno dos nomes das seleções que o Brasil irá enfrentar na primeira fase da Copa do Mundo.
No Jornal Nacional o ambiente é como em qualquer outra redação onde se trabalha muito, com seriedade, e onde a descontração e as brincadeiras entre os colegas são requisitos essenciais para que todos produzam com qualidade. Homer, Dona Maria e o Seu Doutor agradecem.

(*) Jornalista e pesquisador de mídias da Universidade do Minho, em Braga (Portugal)

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